Miguel Roquette, diplomata pelo Douro
7 Setembro 2020
O Douro não tem falta de belas propriedades vinícolas, mas a Quinta do Crasto é uma das mais espectaculares de todas. Crasto é também uma referência internacional pelos bons vinhos desta grande região vinícola portuguesa.
Grande parte do crédito deve-se a Miguel Roquette, o carismático gestor de exportação da Quinta do Crasto. A marca exporta para 54 países, tais como Estados Unidos, Brasil e Reino Unido - os três principais mercados de exportação.
Em junho conheci Roquette para um passeio pela propriedade e uma conversa no terraço da casa principal da quinta. A vista é sensacional, com vinhas em socalcos que descem até ao rio Douro. Crastro é uma variante portuguesa do termo latino para forte, ‘castrum’. Os romanos tinham um forte estratégico na colina aqui com uma visão de 360º de quem subia ou descia o rio. Traços de uma gamela de pisa de uva romana foram descobertos na horta da propriedade. A marca Quinta do Crasto detém duzentos hectares de vinha no Douro, incluindo mais de uma centena no Douro Superior, o que a torna um dos maiores proprietários de vinha da região.
Roquette disse-me que bebeu Porto pela primeira vez aos três meses, acrescentando: “O Porto está no meu sangue. Seremos sempre produtores de Vinho do Porto”. Roquette faz parte da quarta geração da sua família proprietária da Quinta do Crasto, uma vez que a propriedade foi adquirida em 1918 pelo antepassado da sua mãe, Constantino de Almeida, um importante armador de Vinho do Porto. A família não é a primeira proprietária, pois os registros da quinta como propriedade vinícola datam de 1615!
Miguel Roquette descreve o seu pai, Jorge, como “um visionário, que no início dos anos 80 começou a investir na propriedade e a plantar novas vinhas. O meu pai percebeu que o futuro do Douro não estaria só no Vinho do Porto mas igualmente nos vinhos secos”. Hoje, mais de 80% da produção da empresa está nesses vinhos secos. Jorge foi também um dos Douro Boys originais, o grupo de cinco produtores de vinho com visão de futuro que, em 2003, decidiu “que precisávamos de dar as mãos e empurrar”. A Quinta do Crasto é ainda membro deste seleto organismo promocional que já passou quase duas décadas a viajar pelo mundo para construir com sucesso a reputação dos vinhos do Douro.
Roquette acredita que o Douro está “atualmente com 60% do seu potencial”. Embora muitas vezes considerada a região vinícola regulamentada mais antiga do mundo, para vinhos secos é uma das mais jovens, com apenas vinte ou trinta anos de experiência na produção de vinhos de qualidade. “Estamos envolvidos num processo de aprendizagem.”
A quinta produziu o seu primeiro vinho seco em 1994. Devido a uma greve, a trituradora encomendada de França para a vindima não chegou a tempo, pelo que as uvas foram pisadas a pé, à antiga moda duriense. No ano seguinte, a quinta engarrafou o seu primeiro vinho mono-varietal Touriga Nacional. Roquette enviou algumas garrafas para o escritor de vinhos Jancis Robinson. Impressionada, escreveu um artigo simpático sobre a Quinta do Crasto no Financial Times. Mais tarde, ao almoço, provamos uma garrafa do Touriga Nacional 2015, um vinho elegante, com notas de especiarias e frutos vermelhos.
A nova geração do Douro está “mais aberta e sem medo de partilhar”. Muitos dos produtores de vinho e enólogos da região não são apenas primos ou amigos, mas também colegas que trabalham juntos e competem uns com os outros.
O que é que torna os vinhos da Quinta do Crasto tão excepcionais, tão complexos e intensos? Sem dúvida, a enorme diversidade de possibilidades de vinificação oferecida pelo terroir da propriedade: altitudes que vão do nível do rio a 500 metros, diferentes exposições ao sol e mais de sessenta variedades de uvas, algumas plantadas em bloco, outras misturadas. Manuel Lobo, o enólogo da marca, refere-se à propriedade e a estas possibilidades de vinificação como um “puzzle” cujas peças tem de encaixar.
“Estamos convencidos de que os vinhos do Douro têm um enorme potencial de envelhecimento. As vinhas velhas são o bem mais importante que temos no Douro”, continua Roquette. Em Crasto, uma "videira velha" geralmente significa mais de sessenta anos. Um exemplo notável é o lote de vinha Vinha Maria Teresa, que apresenta nada menos que 53 castas diferentes, sendo a maioria das plantas com mais de 110 anos. A Quinta do Crasto concluiu um projeto de mapeamento de vinhedos há alguns meses. No futuro, será possível substituir cada planta quando ela morrer exatamente com o mesmo clone. Roquette descreve este famoso enredo como "uma expressão fantástica de terroir".
Por enquanto, a pandemia de Covid-19 está a atrasar as coisas. As exportações da marca têm sido afetadas pela queda mundial no consumo de restaurantes e bares, e o Douro sofre com o fraco turismo, a maior indústria de Portugal. Num ano ‘normal’, a propriedade recebe tantos pedidos de visita que às vezes não é possível responder positivamente a todos. Os sortudos, porém, tornam-se embaixadores entusiastas da marca.
Roquette está confiante no futuro da Quinta do Crasto a médio prazo. Nos últimos anos, a empresa fez investimentos significativos numa vinícola de última geração numa grande sala de carvalho com temperatura controlada. Aguarda com expectativa o dia em que viajar voltará a ser mais fácil e poderá contar ao mundo sobre os notáveis ??vinhos da Quinta do Crasto.
The author, James Mayor, is the founder of Grape Discoveries, a boutique wine tourism business: www.grapediscoveries.com